domingo, 31 de janeiro de 2010

O MUNDO ESTÁ DE OLHO EM VOCÊ! (Como você se vê?)

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Raul Longo

Há menos de uma década o Brasil acumulava uma das maiores dívidas externas do mundo, sem qualquer perspectiva de saldá-la ao longo de muitas gerações de brasileiros.

Há menos de uma década o Brasil era um dos países menos recomendáveis em investimentos e também em programas internacionais de cooperação, pois eram famosos os desvios de verbas que instituições internacionais enviavam às organizações governamentais, até mesmo quando destinadas para fomentos sociais.

Há menos de uma década o Brasil era um dos campeões mundiais em concentração de rendas e em nível de desemprego. Concorríamos com os piores índices internacionais em analfabetismo, subnutrição, endemias e criminalidade.

Qualquer brasileiro que tenha viajado para os Estados Unidos há 7 anos atrás, ao desembarcar nos aeroportos daquele país foi obrigado a tirar os sapatos e as meias para ser revistado como um terrorista ou marginal em potencial. Inclusive nosso principal representante junto a comunidade das nações, o então Ministro das Relações Exteriores Celso Lafer.

Há menos de uma década o Brasil era um dos países mais humilhados e desprezados da comunidade internacional.

Éramos comentados pelos arrastões de praia, guerras do tráfico, índices de violência e mortes provocadas pela criminalidade urbana e rural, ou por ação da polícia. Os nomes de brasileiros mais citados nas páginas do noticiário internacional eram os de Fernandinho Beira-Mar e Elias Maluco, ou Hildebrando Paschoal e Nicolau dos Santos Neto.


As raras referências aos políticos brasileiros, quando não se tratava de sacrificados pelos detentores do poder, como Chico Mendes, apenas reportavam escândalos sobre fortunas desviadas para paraísos fiscais e flagrantes corrupções que, aqui mesmo, não eram investigadas. E os sacrifícios permaneciam impunes.

As organizações brasileiras mais conhecidas no exterior eram o PCC, o CV e correlatas, quando não as que praticavam algum tipo de golpe internacional. E éramos refúgio dos mais perigosos e afamados bandidos e contraventores estrangeiros.

Há menos de uma década o Brasil era considerado em todo o mundo como um país de difícil e quase impossível solução. Inclusive pelos próprios brasileiros. Você se lembra de quantas vezes afirmou para si mesmo que esse país não tem jeito?

Hoje o mundo tem outra percepção do Brasil. Mas é preciso que os brasileiros percebam que não mais nos olham apenas porque temos petróleo, como há menos de uma década prometeu o então presidente da Petrobras, garantindo aos especuladores internacionais a privatização daquela companhia até o final da gestão do governo para o qual trabalhava.

Hoje o mundo tem outra percepção do Brasil, e não apenas porque resolvemos alguns dos nossos mais cruciais e crônicos problemas, ou porque temos alternativas para o problema dos combustíveis e do aquecimento global.

Hoje o mundo tem outra percepção do Brasil e em nós se depositam muitas das esperanças da humanidade. Apenas os próprios brasileiros ainda não se aperceberam disso.

A Argentina também saldou sua dívida com o FMI. A China cresceu mais do que o Brasil. Governos de outros países também conseguiram resgatar seus povos de histórica situação de miséria. Por que, então, nunca um Presidente, de qualquer nação que seja, foi tão enaltecido pelas principais instituições internacionais e pelos mais significativos veículos de comunicação do mundo?

Desde o final da Segunda Guerra Mundial, nunca um Presidente de qualquer nação do mundo foi tantas vezes laureado, homenageado, elogiado e apontado como exemplo para todos os demais da atualidade e do futuro.

Por que essa predileção dos líderes e dos principais órgãos de imprensa mundiais por nosso Presidente?

Apenas por sua origem humilde? Muitos desses líderes e dirigentes também vieram de origem humilde.

Argentinos constantemente afirmam desejar que Lula, um brasileiro, presida aquele país. Alemães o recebem nas ruas como uma celebridade. Brasileiros que viajam ao exterior, ou estrangeiros que vêm nos visitar, comentam que nas capas dos jornais e revistas dos principais países da Europa e do Oriente, a foto de Lula só não é mais reproduzida do que a de seus próprios presidentes. E nas matérias internacionais sobre os temas mais tangentes da atualidade, comentaristas e articulistas já não opõem a presidência dos Estados Unidos à da Rússia, da França, de Cuba ou da Alemanha. Mas sim à do Brasil. Aquele mesmo Brasil que, há sete anos, era comparado com os mais deficitários países da Ásia, da África e daqui mesmo de nossa sofrida América Latina.

Por que, então, desdizendo todo o gigantesco esforço dos principais veículos da mídia brasileira, o nosso Presidente é considerado "O Cara"? O mais popular governante em exercício? "O homem que assombra ao mundo"? O estadista da paz? O Estadista Global?


Por que a França, a Inglaterra, Espanha, Estados Unidos e Alemanha haveriam de aplaudir tão entusiasticamente o Presidente que impediu a continuidade da política de privatizações que há sete anos tanto beneficiou grupos franceses, ingleses, espanhóis, norte-americanos, alemães e de muitos outros países?

Por que o Fórum que congrega as maiores economias do mundo, haveria de criar o que já se considera como a mais alta distinção política e diplomática da atualidade, para com ela honrar um operário?

Quantas vezes você ouviu falar que nosso Presidente é um apedeuta? Quantas vezes ouviu dizer que não teria capacidade de governar nosso país? Que é fraco? Que não sabe pensar? Que estaria fazendo tudo errado? Que não deveria ter dito isso ou feito aquilo? Que errou?

Até mesmo quando nenhuma nação do mundo reconheceu o governo golpista de Honduras, disseram a você que o Brasil estava errado em não reconhecê-lo. Até mesmo quando todos os governos do mundo apoiaram o Brasil por asilar o presidente deposto por aquele golpe, a imprensa brasileira quis convencê-lo ou o convenceu de que Lula estava errado.

Mas o que importa agora não é saber quem está errado: se os jornalistas brasileiros ou o resto do mundo, pois se quiser entender por que o mundo tem tanta admiração por Luís Ignácio Lula da Silva, esqueça por um momento esses tão "sábios", "experientes" e "capazes" que há tantos anos afirmam tantas coisas sobre Lula que eles próprios esquecem da última que lhe contaram. Será a da mansão no Morumbi ou a da filha que não teria reconhecido? De ser pelego? Do filho que comprou a maior fazenda do país? Do estupro na cadeia? De ser racista? Bêbado? Do projeto de se perpetuar no poder? De ser comunista? De que vai falir o país? Vai espantar o empresariado? Vai fugir? Vai roubar? Da amante? Do 3 em 1? Do cachorro? Do gato?

Mesmo que você ainda acredite em tudo o que lhe dizem do Presidente ou do que já começam a dizer de sua candidata à sucessão; não procure a resposta para o reconhecimento internacional no Lula. Procure a resposta no próprio Brasil, em cada brasileiro.

Inclusive em você mesmo. Ou em você mesma.


Leia com atenção cada linha do discurso abaixo. Se tiver um filho ou uma filha, preferencialmente leia em voz alta para eles também ouvirem. Mas se não tiver filhos ou não estiverem por perto, leia apenas para você mesmo ou mesma, e o faça na frente de um espelho.

Leia com atenção e, quando terminar, procure-se nos olhos do seu filho. Procure-se nos olhos de sua filha. Procure-se nos olhos de seus filhos, ou procure-se no espelho.

Como você se vê?

Raul Longo, jornalista, escritor e pousadeiro, colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz


Ilustração: AIPC - Atrocious International Piracy of Cartoons
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Íntegra do discurso do presidente Lula, lido por Celso Amorim em Davos

Em repouso após passar por uma crise de hipertensão, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não compareceu ao Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, leu o discurso de Lula na cerimônia de entrega do prêmio "Estadista Global". O discurso descreve os avanços obtidos pelo Brasil nos últimos anos em várias áreas.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, recebe das mãos do ex-secretário geral das Nações Unidas Kofi Annan o prêmio de "Estadista Global" conferido ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça
Leia abaixo a íntegra do discurso.

"Minhas senhoras e meus senhores,

Em primeiro lugar, agradeço o prêmio "Estadista Global" que vocês estão me concedendo.

Nos últimos meses, tenho recebido alguns dos prêmios e títulos mais importantes da minha vida.

Com toda sinceridade, sei que não é exatamente a mim que estão premiando - mas ao Brasil e ao esforço do povo brasileiro. Isso me deixa ainda mais feliz e honrado.

Recebo este prêmio, portanto, em nome do Brasil e do povo do meu país. Este prêmio nos alegra, mas, especialmente, nos alerta para a grande responsabilidade que temos.

Ele aumenta minha responsabilidade como governante, e a responsabilidade do meu país como ator cada vez mais ativo e presente no cenário mundial.

Tenho visto, em várias publicações internacionais, que o Brasil está na moda. Permitam-me dizer que se trata de um termo simpático, porém inapropriado.

O modismo é coisa fugaz, passageira. E o Brasil quer e será ator permanente no cenário do novo mundo.

O Brasil, porém, não quer ser um destaque novo em um mundo velho. A voz brasileira quer proclamar, em alto e bom som, que é possível construir um mundo novo.

O Brasil quer ajudar a construir este novo mundo, que todos nós sabemos, não apenas é possível, mas dramaticamente necessário, como ficou claro, na recente crise financeira internacional – mesmo para os que não gostam de mudanças.

Meus senhores e minhas senhoras,

O olhar do mundo hoje, para o Brasil, é muito diferente daquele, de sete anos atrás, quando estive pela primeira vez em Davos.

Naquela época, sentíamos que o mundo nos olhava mais com dúvida do que esperança. O mundo temia pelo futuro do Brasil, porque não sabia o rumo exato que nosso país tomaria sob a liderança de um operário, sem diploma universitário, nascido politicamente no seio da esquerda sindical.

Meu olhar para o mundo, na época, era o contrário do que o mundo tinha para o Brasil. Eu acreditava, que assim como o Brasil estava mudando, o mundo também pudesse mudar.

No meu discurso de 2003, eu disse, aqui em Davos, que o Brasil iria trabalhar para reduzir as disparidades econômicas e sociais, aprofundar a democracia política, garantir as liberdades públicas e promover, ativamente, os direitos humanos.

Iria, ao mesmo tempo, lutar para acabar sua dependência das instituições internacionais de crédito e buscar uma inserção mais ativa e soberana na comunidade das nações.

Frisei, entre outras coisas, a necessidade de construção de uma nova ordem econômica internacional, mais justa e democrática.

E comentei que a construção desta nova ordem não seria apenas um ato de generosidade, mas, principalmente, uma atitude de inteligência política.

Ponderei ainda que a paz não era só um objetivo moral, mas um imperativo de racionalidade. E que não bastava apenas proclamar os valores do humanismo. Era necessário fazer com que eles prevalecessem, verdadeiramente, nas relações entre os países e os povos.

Sete anos depois, eu posso olhar nos olhos de cada um de vocês – e, mais que isso, nos olhos do meu povo – e dizer que o Brasil, mesmo com todas as dificuldades, fez a sua parte. Fez o que prometeu.

Neste período, 31 milhões de brasileiros entraram na classe média e 20 milhões saíram do estágio de pobreza absoluta. Pagamos toda nossa dívida externa e hoje, em lugar de sermos devedores, somos credores do FMI.

Nossas reservas internacionais pularam de 38 bilhões para cerca de 240 bilhões de dólares. Temos fronteiras com 10 países e não nos envolvemos em um só conflito com nossos vizinhos. Diminuímos, consideravelmente, as agressões ao meio ambiente. Temos e estamos consolidando uma das matrizes energéticas mais limpas do mundo, e estamos caminhando para nos tornar a quinta economia mundial.

Posso dizer, com humildade e realismo, que ainda precisamos avançar muito. Mas ninguém pode negar que o Brasil melhorou.

O fato é que Brasil não apenas venceu o desafio de crescer economicamente e incluir socialmente, como provou, aos céticos, que a melhor política de desenvolvimento é o combate à pobreza.

Historicamente, quase todos governantes brasileiros governaram apenas para um terço da população. Para eles, o resto era peso, estorvo, carga.

Falavam em arrumar a casa. Mas como é possível arrumar um país deixando dois terços de sua população fora dos benefícios do progresso e da civilização?

Alguma casa fica de pé, se o pai e a mãe relegam ao abandono os filhos mais fracos, e concentram toda atenção nos filhos mais fortes e mais bem aquinhoados pela sorte?

É claro que não. Uma casa assim será uma casa frágil, dividida pelo ressentimento e pela insegurança, onde os irmãos se vêem como inimigos e não como membros da mesma família.

Nós concluímos o contrário: que só havia sentido em governar, se fosse governar para todos. E mostramos que aquilo que, tradicionalmente, era considerado estorvo, era, na verdade, força, reserva, energia para crescer.

Incorporar os mais fracos e os mais necessitados à economia e às políticas públicas não era apenas algo moralmente correto. Era, também, politicamente indispensável e economicamente acertado. Porque só arrumam a casa, o pai e a mãe que olham para todos, não deixam que os mais fortes esbulhem os mais fracos, nem aceitam que os mais fracos conformem-se com a submissão e com a injustiça. Uma casa só é forte quando é de todos – e nela todos encontram abrigo, oportunidades e esperanças.

Por isso, apostamos na ampliação do mercado interno e no aproveitamento de todas as nossas potencialidades. Hoje, há mais Brasil para mais brasileiros. Com isso, fortalecemos a economia, ampliamos a qualidade de vida do nosso povo, reforçamos a democracia, aumentamos nossa auto-estima e amplificamos nossa voz no mundo.

Minhas senhoras e meus senhores,

O que aconteceu com o mundo nos últimos sete anos? Podemos dizer que o mundo, igual ao Brasil, também melhorou?

Não faço esta pergunta com soberba. Nem para provocar comparações vantajosas em favor do Brasil.

Faço esta pergunta com humildade, como cidadão do mundo, que tem sua parcela de responsabilidade no que sucedeu – e no que possa vir a suceder com a humanidade e com o nosso planeta.

Pergunto: podemos dizer que, nos últimos sete anos, o mundo caminhou no rumo da diminuição das desigualdades, das guerras, dos conflitos, das tragédias e da pobreza?

Podemos dizer que caminhou, mais vigorosamente, em direção a um modelo de respeito ao ser humano e ao meio ambiente?

Podemos dizer que interrompeu a marcha da insensatez, que tantas vezes parece nos encaminhar para o abismo social, para o abismo ambiental, para o abismo político e para o abismo moral?

Posso imaginar a resposta sincera que sai do coração de cada um de vocês, porque sinto a mesma perplexidade e a mesma frustração com o mundo em que vivemos.

E nós todos, sem exceção, temos uma parcela de responsabilidade nisso tudo.

Nos últimos anos, continuamos sacudidos por guerras absurdas. Continuamos destruindo o meio-ambiente. Continuamos assistindo, com compaixão hipócrita, a miséria e a morte assumirem proporções dantescas na África. Continuamos vendo, passivamente, aumentar os campos de refugiados pelo mundo afora.

E vimos, com susto e medo, mas sem que a lição tenha sido corretamente aprendida, para onde a especulação financeira pode nos levar.

Sim, porque continuam muitos dos terríveis efeitos da crise financeira internacional, e não vemos nenhum sinal, mais concreto, de que esta crise tenha servido para que repensássemos a ordem econômica mundial, seus métodos, sua pobre ética e seus processos anacrônicos.

Pergunto: quantas crises serão necessárias para mudarmos de atitude? Quantas hecatombes financeiras teremos condições de suportar até que decidamos fazer o óbvio e o mais correto?

Quantos graus de aquecimento global, quanto degelo, quanto desmatamento e desequilíbrios ecológicos serão necessários para que tomemos a firme decisão de salvar o planeta?

Meus senhores e minhas senhoras,

Vendo os efeitos pavorosos da tragédia do Haiti, também pergunto: quantos Haitis serão necessários para que deixemos de buscar remédios tardios e soluções improvisadas, ao calor do remorso?

Todos nós sabemos que a tragédia do Haiti foi causada por dois tipos de terremotos: o que sacudiu Porto Príncipe, no início deste mês, com a força de 30 bombas atômicas, e o outro, lento e silencioso, que vem corroendo suas entranhas há alguns séculos.

Para este outro terremoto, o mundo fechou os olhos e os ouvidos. Como continua de olhos e ouvidos fechados para o terremoto silencioso que destrói comunidades inteiras na África, na Ásia, na Europa Oriental e nos países mais pobres das Américas.

Será necessário que o terremoto social traga seu epicentro para as grandes metrópoles européias e norte-americanas para que possamos tomar soluções mais definitivas?

Um antigo presidente brasileiro dizia, do alto de sua aristocrática arrogância, que a questão social era uma questão de polícia.

Será que não é isso que, de forma sutil e sofisticada, muitos países ricos dizem até hoje, quando perseguem, reprimem e discriminam os imigrantes, quando insistem num jogo em que tantos perdem e só poucos ganham?

Por que não fazermos um jogo em que todos possam ganhar, mesmo que em quantidades diversas, mas que ninguém perca no essencial

O que existe de impossível nisso? Por que não caminharmos nessa direção, de forma consciente e deliberada e não empurrados por crises, por guerras e por tragédias? Será que a humanidade só pode aprender pelo caminho do sofrimento e do rugir de forças descontroladas?

Outro mundo e outro caminho são possíveis. Basta que queiramos. E precisamos fazer isso enquanto é tempo.

Meus senhores e minhas senhoras,

Gostaria de repetir que a melhor política de desenvolvimento é o combate à pobreza. Esta também é uma das melhores receitas para a paz. E aprendemos, no ano passado, que é também um poderoso escudo contra crise.

Esta lição que o Brasil aprendeu, vale para qualquer parte do mundo, rica ou pobre.

Isso significa ampliar oportunidades, aumentar a produtividade, ampliar mercado e fortalecer a economia. Isso significa mudar as mentalidades e as relações. Isso significa criar fábricas de emprego e de cidadania.

Só fomos bem sucedidos nessas tarefas porque recuperamos o papel do Estado como indutor do desenvolvimento e não nos deixamos aprisionar em armadilhas teóricas – ou políticas – equivocadas sobre o verdadeiro papel do estado.

Nos últimos sete anos, o Brasil criou quase 12 milhões de empregos formais. Em 2009, quando a maioria dos países viu diminuir os postos de trabalhos, tivemos um saldo positivo de cerca de um milhão de novos empregos.

O Brasil foi um dos últimos países a entrar na crise e um dos primeiros a sair. Por que? Porque tínhamos reorganizado a economia com fundamentos sólidos, com base no crescimento, na estabilidade, na produtividade, num sistema financeiro saudável, no acesso ao crédito e na inclusão social.

E quando os efeitos da crise começaram a nos alcançar, reforçamos, sem titubear, os fundamentos do nosso modelo e demos ênfase à ampliação do crédito, à redução de impostos e ao estímulo do consumo.

Na crise ficou provado, mais uma vez, que são os pequenos que estão construindo a economia de gigante do Brasil.

Este talvez seja o principal motivo do sucesso do Brasil: acreditar e apoiar o povo, os mais fracos e os pequenos. Na verdade, não estamos inventando a roda. Foi com esta força motriz que Roosevelt recuperou a economia americana depois da grande crise de 1929. E foi com ela que o Brasil venceu preventivamente a última crise internacional.

Mas, nos últimos sete anos, nunca agimos de forma improvisada. A gente sabia para onde queria caminhar. Organizamos a economia sem bravatas e sem sustos, mas com um foco muito claro: crescer com estabilidade e com inclusão.

Implantamos o maior programa de transferência de renda do mundo, o Bolsa Família, que hoje beneficia mais de 12 milhões de famílias. E lançamos, ao mesmo tempo, o Programa de Aceleração do Crescimento, o PAC, maior conjunto de obras simultâneas nas áreas de infra-estrutura e logística da história do país, no qual já foram investidos 213 bilhões de dólares e que alcançará, no final do ano de 2010, um montante de 343 bilhões.

Volto ao ponto central: estivemos sempre atentos às politicas macro-econômicas, mas jamais nos limitamos às grandes linhas. Tivemos a obsessão de destravar a máquina da economia, sempre olhando para os mais necessitados, aumentando o poder de compra e o acesso ao crédito da maioria dos brasileiros.

Criamos, por exemplo, grandes programas de infra-estrutura social voltados exclusivamente para as camadas mais pobres. É o caso do programa Luz para Todos, que levou energia elétrica, no campo, para 12 milhões de pessoas e se mostrou um grande propulsor de bem estar e um forte ativador da economia.

Por exemplo: para levar energia elétrica a 2 milhões e 200 mil residências rurais, utilizamos 906 mil quilômetros de cabo, o suficiente para dar 21 voltas em torno do planeta Terra. Em contrapartida, estas famílias que passaram a ter energia elétrica em suas casas, compraram 1,5 milhão de televisores, 1,4 milhão de geladeiras e quantidades enormes de outros equipamentos.

As diversas linhas de microcrédito que criamos, seja para a produção, seja para o consumo, tiveram igualmente grande efeito multiplicador. E ensinaram aos capitalistas brasileiros que não existe capitalismo sem crédito.

Para que vocês tenham uma idéia, apenas com a modalidade de "crédito consignado", que tem como garantia o contracheque dos trabalhadores e aposentados, chegamos a fazer girar na economia mais 100 bilhões de reais por mês. As pessoas tomam empréstimos de 50 dólares, 80 dólares para comprar roupas, material escolar, etc, e isto ajuda ativar profundamente a economia.

Minhas senhoras e meus senhores,

Os desafios enfrentados, agora, pelo mundo são muito maiores do que os enfrentados pelo Brasil.

Com mudanças de prioridades e rearranjos de modelos, o governo brasileiro está conseguindo impor um novo ritmo de desenvolvimento ao nosso país.

O mundo, porém, necessita de mudanças mais profundas e mais complexas. E elas ficarão ainda mais difíceis quanto mais tempo deixarmos passar e quanto mais oportunidades jogarmos fora.

O encontro do clima, em Copenhague, é um exemplo disso. Ali a humanidade perdeu uma grande oportunidade de avançar, com rapidez, em defesa do meio-ambiente.

Por isso cobramos que cheguemos com o espírito desarmado, no próximo encontro, no México, e que encontremos saídas concretas para o grave problema do aquecimento global.

A crise financeira também mostrou que é preciso uma mudança profunda na ordem econômica, que privilegie a produção e não a especulação.

Um modelo, como todos sabem, onde o sistema financeiro esteja a serviço do setor produtivo e onde haja regulações claras para evitar riscos absurdos e excessivos.

Mas tudo isso são sintomas de uma crise mais profunda, e da necessidade de o mundo encontrar um novo caminho, livre dos velhos modelos e das velhas ideologias.

É hora de re-inventarmos o mundo e suas instituições. Por que ficarmos atrelados a modelos gestados em tempos e realidades tão diversas das que vivemos? O mundo tem que recuperar sua capacidade de criar e de sonhar.

Não podemos retardar soluções que apontam para uma melhor governança mundial, onde governos e nações trabalhem em favor de toda a humanidade.

Precisamos de um novo papel para os governos. E digo que, paradoxalmente, este novo papel é o mais antigo deles: é a recuperação do papel de governar.

Nós fomos eleitos para governar e temos que governar. Mas temos que governar com criatividade e justiça. E fazer isso já, antes que seja tarde.

Não sou apocalíptico, nem estou anunciando o fim do mundo. Estou lançando um brado de otimismo. E dizendo que, mais que nunca, temos nossos destinos em nossas mãos.

E toda vez que mãos humanas misturam sonho, criatividade, amor, coragem e justiça elas conseguem realizar a tarefa divina de construir um novo mundo e uma nova humanidade.

Muito obrigado."


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PressAA

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sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

Transexual não vive de moleza

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Nena, Flávia e Gleiciane

Urariano Mota

O V Encontro de Travestis e Transexuais do Nordeste, de 13 a 16 de agosto de 2008, foi o primeiro a se realizar no Recife. Não que faltassem outros encontros do gênero, nas ruas noturnas da cidade. Mas à luz do dia, em hotel confortável de Boa Viagem, com apoio do poder público, foi o primeiro.

Os temas desse encontro bem que poderiam aparecer em qualquer reunião de cidadania: educação, saúde, segurança e trabalho. Para travestis, no entanto, esses temas sofreram uma tradução, mais específica: “redução das infecções do HIV/Aids, Hepatites, DSTs em Travestis, Transexuais do Nordeste, promovendo auto-estima das mesmas; trabalhar com lideranças do movimento de Travestis e Transexuais do Nordeste em Educação, Saúde, Segurança, Trabalho, Mídia e Diversidade”.

O contato com as participantes foi conduzido por dirigentes da Gestos e Amotrans, ongs que entre outras lideravam a reunião. Falei-lhes do respeito à pessoa que seria buscado. Então se apresentaram Nena, Flávia e Gleiciane. Se o leitor me acompanha, fará algumas descobertas.

A primeira delas é que há sinais na luta de travestis pela sobrevivência, que os de fora não notamos. Agitar a cabeça, jogando os cabelos longos sobre o ombro, por exemplo. Nas mulheres de origem biológica e definição, isso pode ser instinto de fêmea para seduzir, pura armadilha da feminilidade. Em travestis, não. É uma afronta dirigida à concorrente ou à intrusa. Marcação de terreno. “Desapareça! O que você quer?!”, gritam em silêncio com o jogar de cabelos nos ombros.
A segunda descoberta é que seus nomes não são simples nomes de guerra. Os nomes são as suas pessoas. Mais, o que não podíamos sequer adivinhar: o sexo macho de nascimento, para elas, é larva. Porque a sua plenitude é ser mulher. Daí que prefiram, exijam ser chamadas sempre com todos os substantivos e adjetivos no feminino. E reescrevam a definição de gênero: não são os ou as travestis, como está no dicionário. São as travestis. As meninas. As senhoras, damas, princesas ou senhoritas. Sem a menor sombra de ridículo ou ironia. Nasceram assim e são assim, um conflito vivo. Nada de Almodóvar. Nada de glamour.

Nena Patrícia é uma jovem morena, com a pele a rebentar como uma adolescente. Tem 29 anos e aparenta ter menos. Daí que se pode acreditar na idade que declara. Alimenta, como todas, o sonho de encontrar um marido, de preferência carinhoso, trabalhador, fiel.

- Mas vai ser tranqüilo arranjar um marido, você tendo o sexo masculino?

- Vai, até já passei pela experiência, convivi com um rapaz por quatro anos. Mas não foi muito boa, foi até trágica, porque no final ele era muito violento, me batia. Ele me ameaçava, que ia me matar, que ia me fazer horrores. Ele era muito ciumento, obsessivo, possessivo. Mas não coloquei na cabeça que todo homem vai ser assim. Espero um dia encontrar um bem diferente.

Passo então para Gleiciane. Ela é uma liderança natural, desconfiada e esquiva como poucas. É a presidente da ong Amotrans. Tem 38 anos, a pele clara, e conta que vai fazer o vestibular de gastronomia.

- Você se descobriu homossexual com que idade?
- Com treze anos. Mas na infância, eu me achava mais menina.
- Qual o divisor, qual o limite, de deixar de ser homossexual para ser travesti?
- Isso aí é uma questão de cabeça. Desde criança eu me identificava como mulher. A homossexualidade é diferente. Travesti é aquela que se veste 24 horas, que se caracteriza como mulher, que tem corpo de mulher, toma hormônio...

Flávia, a terceira a ser ouvida, está impaciente, quer dar a sua opinião. Aparenta ser a mais madura. Peço-lhe que se apresente, e cometo a indelicadeza de lhe pedir a idade.

- Sou Flávia Desirée, fiz agora no dia 7 de agosto 38 anos.
- Desirée... Por que esse Desirée, Flávia?
- É porque é um sobrenome francês, cheio assim de significação... é um sobrenome mais forte. E sou autônoma, trabalho com artesanato.
- Que tipo de artesanato?
- Trabalho com máscaras, penas, cabaças, cerâmica. Trabalho com todo tipo de material que eu possa transformar. Pego as matérias-primas e transformo em arte.
- Assim como você fez transformação no seu próprio corpo?
- Sim, fiz. Fiz transformação injetável. Eu passei do hormônio para o silicone. Eu tenho o rosto siliconado, tenho os seios siliconados, tenho os quadris siliconados. Toda feita com silicone.

Das três, ela é a que possui mais experiência. Ao lhe perguntar se já sofreu violência, ela me devolve:

- Qual delas? Porque eu já fui seqüestrada, já fui atirada (empurrada do alto), já me levaram pra mata, pro Lixão da Muribeca, para uma praia deserta, onde me fizeram tirar a roupa... e tudo isso tanto dos marginais quanto da polícia. Em várias cidades. Rio, São Paulo, Vitória...
- Em qual delas a barra é mais pesada para a travesti?
- Rio de Janeiro e São Paulo. É pior do que o Recife. Rio e São Paulo é mais problemático. Eu não sei se era por causa da época, década de 80, mas quando eu comecei a viajar, lá as coisas eram muito mais violentas. Em São Paulo muitas travestis se jogavam, se atiravam do viaduto, quando viam o carro da polícia. Muitas se escondiam, a polícia caçava com cachorro, dava choque elétrico...


Volto para Nena Patrícia. Das três é a que aparenta ser a mais frágil, ou a que procura se adequar a um ideal leve, de louça, a que um vento mais bravo poderia quebrar.

- Em um mundo ideal, você seria travesti?
- Seria. Se eu renascesse, voltaria a ser travesti. É como diz Caetano Veloso, “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Apesar de tudo.
- Mas você tem mais dor ou delícia de ser o que é?
- É.... (Silêncio) É uma delícia assim, porque eu sou o que sou, a minha pessoa, a minha expressão. Acho que é mais... é muita dor, mas também não poderia ser de outra forma, porque eu não saberia me reprimir. Seria mais frustrante viver reprimida, sem me expressar.

No que Flávia Desirée muito discorda.

- Eu mesma já disse à minha mãe: “quando um dia eu morrer, eu não quero reencarnar no corpo de uma travesti mais não. Porque eu não agüento mais”. É uma vida muito sofrida, porque todo o mundo apedreja. Uns abraçam, outros apedrejam. Os que abraçam a gente são muito poucos. Os que apedrejam são muitos. A gente cai e se levanta.
- Então não existe a opção de ser homossexual ou travesti.
- Não. É um sofrimento. E ao mesmo tempo é aquela coisa: destino. Porque quando a gente nasce, a gente não sabe. A criança, quando a mãe gera, ela não sabe o destino do filho. E ele vai se desenvolvendo. Até você saber o que o seu filho vai ser, já tem corrido o tempo.


O que é uma verdade, travestida de ameaça. Pior, travestida em fatalidade. Como numa predição de tragédia no palco. Por isso volto a Nena Patrícia, quem sabe se ela, mais gentil, não teria um conselho de coração a transmitir, como em antigos programas de rádio. Ao que ela responde:

- Eu diria às pessoas que olhassem as diferenças como uma coisa normal. Porque nós somos diferentes, mas por outro lado somos iguais, em direitos, a todo o mundo. Somos cidadãs, somos seres humanos, pagamos impostos. Somos diferentes em nossa expressão, mas não somos diferentes em direitos e obrigações.

Faço a mesma pergunta a Flávia Desirée, que severa responde:

- Eu daria um conselho à sociedade: que apoiasse as causas das minorias, das travestis que vivem nas ruas sofrendo, sendo humilhadas, sendo espancadas. E apoiasse as travestis que vivem sem recursos, sem canto onde se abrigar, que moram na rua, feito mendigo. Isso não é vida. Nenhuma delas nasceu pra ficar jogada na beira de uma esquina, esperando a morte chegar. Isso é o que a gente vê, e a sociedade bota um pano pra cobrir, que nem a justiça, porque dizem que a justiça é cega.

Ao fim, ela pede que na foto sejam evitados os seus pés. Sabemos por quê. Não ficaria bem uma Desirée mostrar pés feridos e pouco inchados.


Urariano Mota, escritor e jornalista, autor de “Soledad no Recife” (Boitempo – 2009) seu último romance, indicado como um possível livro do ano pelo conceituado site Nova Cultura, elaborado e administrado na Alemanha, com os destaques literários da CPLP - Comunidade de Países de Língua Portuguesa; é colunista do site Direto da Redação.

Colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz

Ilustração: AIPC - Atrocious International Piracy of Cartoons

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PressAA

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quinta-feira, 28 de janeiro de 2010

A cronologia da mentira

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Sonia Montenegro

Já que a grande estratégia da oposição para impedir o crescimento da pré-candidata à sucessão de Lula, Dilma Rousseff, é acusá-la de mentirosa, vale a pena lembrar quem de fato mente:

Caso 1 - Dossiê anti-FHC

Em 9 de maio de 2005, o Arthur Virgílio Neto, senador (PSDB-AM), solicita à Casa Civil, sob o comando da Ministra Dilma Rousseff, um levantamento dos gastos cartões corporativos e contas tipo B, do período 1995-2002 (mandato FHC). Ela informa ao senador que a Casa Civil, por recomendação do TCU, está organizando um Banco de Dados das despesas efetuadas pelo Governo Federal, mas está dando prioridade ao período do mandato do Presidente Lula, mas que oportunamente, retroagirá aos mandatos anteriores. Neste momento ele fica sabendo que é intenção da Casa Civil colocar no Banco de Dados também as informações relativas ao governo FHC. Esse fato foi lembrado pela Dilma quando compareceu ao Senado, na frente do tucano, que não a contestou.

No dia 26 de março de 2008, a Revista (não)Veja publica matéria na qual acusa a Ministra Dilma Rousseff, de “montar dossiê” com as despesas pagas com o dinheiro público pelo ex-presidente FHC, hipoteticamente, para chantagear a oposição. As supostas “denúncias” em nada denegriam o suposto “acusado”, deixando no ar a pergunta: para que montar um dossiê contra uma pessoa que não traz nada de grave contra ela, principalmente quando sabemos que motivos não faltam?

No dia 3 de abril de 2008, o jornalista Ricardo Noblat diz em seu blog que o senador Álvaro Dias (PSDB-PR) era o informante da reportagem da revista (não)Veja sobre o chamado “dossiê”. No dia seguinte, Álvaro Dias reconhece ter passado as informações para a revista. Se fosse de fato uma peça contra o ex-presidente FHC, por que vasá-lo para seus aliados?

Em 6 de abril de 2008, Dom Angélico Bernardino, bispo (SC), sobre as discussões em CPI’s e dossiês: “Fico preocupado quando vejo o Legislativo gastando tanto tempo em discussões que não têm levado a nada, enquanto projetos importantes ficam engavetados. Isso também é corrupção”.

Em 7 de abril de 2008, Luiz Nassif: “O clima ficou pesado com essa guerra irracional em torno do relatório de despesas do Planalto - que alguns teimam em chamar de dossiê. Que tal baixarmos a bola, aqui, e retomarmos as discussões mais técnicas e menos passionais?” No mesmo dia, governadores do Norte e Nordeste vão ao presidente Lula, solicitar ajuda para os desabrigados pelas enchentes, que edita uma medida provisória, liberando R$ 540 milhões para ações emergenciais, mas a oposição não aprova, porque está ocupada com golpes e dossiês.

No dia 7 de maio de 2008, a Ministra Dilma Rousseff, em sessão no Congresso, coloca o senador Agripino Maia (Arena/PDS/PFL/DEM-RN) em saia-justa: ele afirma que ela confessara ter mentido em interrogatório sob tortura na ditadura, e insinua que ela poderia estar mentindo aos parlamentares naquele momento. Ela afirma que tinha na época 19 anos, que ficou 3 anos na cadeia, que foi barbaramente torturada e que, naquelas circunstâncias, fácil era falar a verdade e colocar em risco a vida dos companheiros, e que mentir podia salvar vidas. Disse ter orgulho por ter lutado contra a ditadura, enquanto ele batalhava para mantê-la (ou seja, mamava nas tetas). Também se disse favorável à abertura das contas de todos os presidentes, logo após o fim de seus mandatos.

Em 21 de maio de 2008, Merval Pereira colunista de O Globo, afirma que Álvaro Dias declarou à rádio CBN, das Organizações Globo, que pediu a seu assessor André Fernandes que conseguisse o que acabou se chamando “dossiê”, com os gastos do ex-presidente FHC, o que comprova ter sido uma “armação” da oposição e da imprensa para incriminar pessoas inocentes. Chegaram a exigir que a Ministra demitisse sua assessora, Erenice Guerra. Denunciaram, julgaram e condenaram, mesmo sabendo tratar-se de uma farsa.

Finalmente, em 30 de junho de 2008, a Comissão de Ética Pública arquiva o processo do DEM e PSDB contra a ministra Dilma Rousseff no suposto episódio da montagem de um “dossiê” com gastos da gestão FHC com os cartões corporativos, provando que a iniciativa era puramente golpista. Sepúlveda Pertence afirmou que as explicações da ministra convenceram, ou seja, que a Casa Civil montou um banco de dados e não um dossiê, que os senadores já tinham conhecimento prévio do fato e que as denúncias não se baseavam em fatos, mas em matérias jornalísticas. Ahhhhhhhhhhhhhhhhhh! Mais uma CPI para gastar o dinheiro público, aparecer na TV e enganar os trouxas.

Caso 2 – Ficha de Dilma no Dops

Em 5 de abril de 2009, o Jornal Folha de São Paulo publica uma ficha da Ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff cuja origem é atribuída ao DOPS, na qual ela era acusada de terrorista e assaltante de banco. Publica também uma entrevista com Antonio Roberto Espinosa, que daria respaldo à matéria, porém, ao ler, Espinosa nega as afirmações atribuídas a ele e desafia o Jornal a publicar em seu site as fitas da entrevista gravada, mas o Jornal não o faz.
A ficha foi identificada como falsa por 5 institutos especializados em análise de documentos, feita na internet, em época que ela não existia.

Caso 3 - Lina Vieira

Em 10 de maio de 2009, Lina Vieira “deixa vazar” para imprensa, que a Petrobras havia mudado o regime tributário ao qual estava submetida, de caixa para competência, para se beneficiar de um crédito de R$ 3,9 bilhões, o que dará ensejo à oposição de fazer uma CPI da Petrobras. O jornal O Globo - RJ publica matéria intitulada “Artifício faz Petrobras pagar menos imposto”, denunciando suposta sonegação fiscal da Petrobras.

Em 18 de maio de 2009, apesar das explicações da empresa, da Receita e diversos tributaristas atestando a legalidade da opção adotada, e não apenas pela Petrobras, mas também por diversas empresas, a oposição ainda insiste em gastar o nosso dinheirinho e criar a CPI para investigar a Petrobras. Desconfia-se que as verdadeiras razões sejam puramente políticas, para parar o Senado e com a ajuda da imprensa atrapalhar a votação de uma lei mais nacionalista para o petróleo do pré-sal, como quer o presidente Lula.

Em 20 de maio de 2009, surge a revelação da ligação de Lina Vieira com o senador Agripino Maia (de novo), e que é casada com um ex-ministro de FHC, ambos de ferrenha oposição ao governo Lula, privatistas e neoliberais entreguistas.

Em 15 de julho de 2009, Lina Vieira é demitida da Receita Federal, pela queda na arrecadação bem superior à queda do PIB causada pela crise mundial. A imprensa acusa o governo de retaliação pela denúncia feita à Petrobras. Curioso é que antes, a imprensa criticava Lina Vieira por estar aparelhando a Receita e pela queda na arrecadação. Curiosamente a maior queda foi a dos grandes contribuintes (grupo que ela prometia maior rigor), de -27,9% de janeiro a julho, comparado ao mesmo período do ano anterior.

Em 16 de julho de 2009, Lina Vieira, ex-secretária da Receita, em entrevista à Folha de São Paulo diz que “muitas empresas utilizaram o mesmo mecanismo previsto em lei.” Mas ela acusou única e exclusivamente a Petrobras. Por que?

Mas os planos maléficos de Dona Lina ainda não estariam concluídos. No dia 9 de agosto de 2009, ela concede uma entrevista ao desmoralizado jornal Folha de São Paulo, e nela acusa a ministra Dilma Rousseff de, em uma reunião próxima ao Natal de 2008, ter pedido que ela acelerasse as investigações contra Fernando Sarney. Ela afirma que entendeu como uma instrução para “aliviar” a investigação. A ilação de Lina vira verdade para a imprensa, ainda que a Dilma tenha negado o encontro e o pedido. O ônus da prova que cabe à acusadora, é cobrado de Dilma. Lina não sabia a data da reunião, reconheceu que não constava de sua agenda, como também não constava da agenda da Ministra, mas a imprensa prefere acreditar na "interpretação" de Lina, em vez da negação veemente de Dilma e ausência de fatos comprobatórios.

Porém, no dia 25 de agosto de 2009, em entrevista ao programa “Entre Aspas” da Globonews, o ex-secretário da Receita Federal, Everardo Maciel no governo FHC, desmonta os argumentos da ex-secretária Lina Vieira: “Quem está absolutamente certa é a Petrobrás”. Sobre a acusação do que a Ministra Dilma Rousseff teria dito, afirma: “se tivesse havido o diálogo, deveria ter sido denunciado na ocasião, e como não fez, pode agora ser condenada por prevaricação”. Mesmo após Dona Lina ser desmascarada, a imprensa ainda mantém a sua falsa versão, para colar em Dilma Rousseff a fama de mentirosa.

Caso 4 - Sergio Guerra

Em 13 de janeiro de 2010, em entrevista à revista (não)Veja Sergio Guerra, presidente do PSDB, faz mais uma tentativa de colar a imagem de “mentirosa” na Ministra Dilma: “Mente sobre o PAC, mente sobre sua função. Não é gerente de um programa de governo e, sim, de uma embalagem publicitária que amarra no mesmo pacote obras municipais, estaduais, federais e privadas”.

Diz mais:

Mudanças substanciais na política econômica: "Sem dúvida nenhuma. Iremos mexer na taxa de juros, no câmbio e nas metas de inflação. Essas variáveis continuarão a reger nossa economia, mas terão pesos diferentes. Nós não estamos de acordo com a taxa de juros que está aí, com o câmbio que está aí." A cara de pau do senador é tamanha, que ousa falar de taxa de juros. Quando Lula assumiu o governo, em 1 de janeiro de 2003, a taxa de juros era de 25%. Em 22 de julho de 2009, o Banco Central do Brasil reduz a taxa de juros em 1 ponto percentual, para 8,25%, a menor na história do país. Mas em 10 de setembro de 1998, no governo FHC, os juros explodiram, chegando a 42,12%. , o que levou Stefan Salej, presidente da Federação das Indústrias de MG, na época a declarar “Nem a prostituição tem retorno maior que a taxa de juros”.

PAC: "Isso é o PAC na realidade - e nós vamos acabar com ele." Porém o senador Sergio Guerra não gostou quando a Ministra Dilma, em inauguração de uma obra do PAC, disse que o presidente do PSDB tinha declarado que se eles ganhassem a eleição acabariam com o PAC. Afinal de contas, o PAC é uma obra de ficção, um programa eleitoreiro ou uma realidade?

Mensalão do PSDB: "Eu não concordo que tenha havido mensalão em Minas. O senador Azeredo é um dos homens públicos mais íntegros do país. Temos certeza de que ele será inocentado no STF." Ou seja: “As pessoas comumente criticam nos outros os defeitos que não vêem nelas próprias”. B. Calheiros Bomfim

A contra-partida:

Caso 1 – Serra e o PSDB, os verdadeiros terroristas

Em 8 de junho de 2002, o megaespeculador húngaro naturalizado norte-americano George Soros, afirma: “O Brasil está condenado a eleger José Serra ou mergulhar no caos assim que um determinado governo Luiz Inácio Lula da Silva se instalar”. Poderia ser um palpite qualquer, mas não podemos esquecer que o megaespeculador era o patrão de Armínio Fraga, então presidente do Banco Central do governo FHC.

Mais pra frente, a “grande” atriz Regina Duarte fatura uns trocados na campanha de Serra, morta de medo de uma possível vitória do candidato da oposição, nosso querido presidente Lula. Medo de perder a estabilidade conquistada. O Serra, dizia ela que conhecia, que fez os genéricos e o combate a AIDS. “Isso dá medo na gente...” dizia ela.

Lula transformaria o Brasil numa “Argentina”, mas quem destruiu a Argentina foi o grande amigo de FHC, Carlos Menem, com a falsa paridade entre o dólar e o real, política adotada por FHC por todo o 1º mandato, prometendo mantê-la no 2º mandato, embora não tenha cumprido.

“Em outubro de 1998, o presidente do Brasil, Fernando Henrique Cardoso, foi reeleito para o cargo por um único motivo: tinha estabilizado o valor da moeda brasileira e, portanto, contido a inflação. Na verdade, não tinha. O real brasileiro estava ridiculamente supervalorizado. Mas com a aproximação das eleições, sua taxa de câmbio contra o dólar simplesmente desafiava a gravidade. Esse milagre levou Cardoso à linha de chegada com 54% dos votos. Mas não existem milagres. Quinze dias depois da posse de FHC, o real despencou e morreu. Seis meses depois da eleição, ele tinha aproximadamente a metade de seu valor no dia da eleição. A inflação aumentando e a economia implodindo. A taxa de aprovação de Cardoso, que se revelou um incompetente e uma farsa, caiu para 23% do eleitorado. Tarde demais. Ele já havia colocado a presidência no bolso”. Greg Palast, jornalista da BBC em entrevista à Revista Carta Capital em 10 de março de 2004.

Em 7 de novembro de 2004, FHC critica a estratégia do medo usada por Bush contra Kerry, esquecendo-se que essa foi a estratégia usada por ele contra o Lula, (radicalismo e perda da estabilidade do Real), e posteriormente adotada por Serra (nos exemplos citados acima).

Caso 2 - Não foi Serra quem criou o programa de combate a Aids

O Programa Nacional de Combate à AIDS foi criado no governo de José Sarney. A distribuição gratuita de AZT, foi uma providência do então Ministro da Saúde, Adib Jatene, no governo Collor. Os governos que sucederam deram força ao programa, mas foi o Dr. Adib Jatene, outra vez Ministro da Saúde, desta vez já no governo FHC, que possibilitou que o Brasil produzisse o AZT. Cadê o Serra?

Caso 3 - Serra não criou os medicamentos genéricos

Em 5 abril de 1993, o decreto 793 de autoria do Ministro da Saúde Jamil Haddad no governo Itamar Franco cria os medicamentos genéricos no Brasil. Jamil Haddad denunciou à imprensa, mas por motivos óbvios, não foi ouvido. Segundo Haddad, Serra provocou retrocesso na lei dos Genéricos, e suavizou para a indústria Farmacêutica.

Caso 4 - Serra mente quando afirma ser economista

O professor José Carlos de Assis, PhD em Física pelo MIT, escreveu no Jornal do Brasil em 17 de outubro de 2002: “Mas, paradoxalmente, falta também explicar uma questão muito estranha: por que ele (Serra) permitiu tantas ironias ao Sr. Lula, por não ter diploma de curso superior, apesar de ter profissão bem definida? O candidato ao governo, pasme leitor, não tem profissão: não é engenheiro nem economista. Custa muito acreditar”. Esse é apenas um de diversos depoimentos que nunca foram desmentidos.

Caso 5 - Serra pede que não votem nele

Em 31 de agosto de 2004, no debate da TV Record na campanha para a prefeitura de São Paulo, José Serra se compromete a cumprir os 4 anos de mandato e pedir que não votem mais nele caso renuncie antes da hora. Renunciou para se candidatar ao governo do Estado, portanto, se temos vergonha na cara, o mínimo que podemos fazer é não votar nele!!!

Caso 6 - Serra não quebrou patente de remédio algum, como afirma

O Serra de fato ameaçou quebrar a patente do anti-retroviral Efavirenz, mas foi um decreto assinado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 4 de maio de 2007 que quebrou de fato a patente do medicamento, representando uma economia ao país de US$ 30 milhões/ano.

Caso 7 - Serra plagiador

Em 25 de abril de 2008, Vitor Frederico Kümpel, Juiz de Direito, condena o PSDB em ação movida por Hilton Acioli, autor do jingle de campanha política ‘Lula lá’, usado sem autorização na campanha de José Serra em 2002, ao pagamento da quantia de R$ 112.500,00 (para confirmar a notícia: http://espacovital.com.br/busca.php, busca pelo nome do autor Hilton Acioli.

Caso 8 - Serra mente que entende alguma coisa de saúde, embora tenha sido Ministro... da Saúde

Em 2 de maio de 2009, José Serra explica a Gripe A-H1N1: "Ela é transmitida dos porquinhos para as pessoas só quando eles espirram. Portanto, a providência elementar é não ficar perto de porquinho algum".

Caso 9 - Serra faz propaganda mentirosa da Sabesp no exterior, com dinheiro dos paulistas

Em sua coluna na Folha de São Paulo e em O Globo em 3 de maio de 2009, Elio Gaspari comenta a propaganda da SABESP na revista internacional "Foreign Policy", um encarte de 16 páginas sobre as "maravilhas" da administração tucana de São Paulo sob o título "Sweet smell of sucess". A propaganda de José Serra afirma que cuidam da boa qualidade da água e que esse serviço "continua na estação de tratamento de esgotos, afinal, reciclar a água é uma questão de honra para a Sabesp, honra e respeito”. Gaspari desmente e afirma que a SABESP despeja esgoto in natura em 6.670 pontos de rios e córregos de São Paulo. Propaganda cara e enganosa, paga pelo contribuinte.

Caso 10 - Serra é desmentido

Em 4 de junho de 2009, Alex Agostini, economista-chefe da agência de classificação de risco Austin Ratings, contesta o governador de SP José Serra, que acusou a agência de estar “comprada” por especuladores, por rebaixar o rating de SP, perguntando quem a teria comprado. Para o economista, Serra deveria se ater à íntegra do relatório antes de emitir qualquer comentário, e que a avaliação diz respeito à emenda constitucional (que ele se empenhou para aprovar) que cria um teto para pagamento de precatórios, vista como uma oficialização do calote. É o caso de pessoas que processam o Estado, ganham na justiça mas morrem antes de receber.

Caso 11 - Serra mente para os pernambucanos.

Ele pensa que nordestino é burro!

Em 3 de agosto de 2009, Assis Ângelo, o biógrafo de Luiz Gonzaga desmente José Serra, que em visita (campanha) a Exu (PE), cidade onde Gonzaga nasceu, afirmou ter sido amigo do compositor. Assis Ângelo afirma que Gonzaga nem conheceu e muito menos foi amigo de Serra.

Caso 12 - Serra mente até pra crianças

No dia 15 de setembro de 2009, Vandson Lima (Valor Econômico) fala sobre o evento promovido pelo PSDB, quando na saída, José Serra foi abordado por 2 meninos que foram cobrá-lo por uma promessa não cumprida: Serra garantiu aos garotos que lhes daria pipas e peões. Para demonstrar simpatia, Serra perguntou onde moravam, e a resposta não poderia ter sido mais constrangedora: “na rua, aqui na [Avenida] Rebouças, pertinho. Mora bastante gente lá”. O governador sacou algumas notas do bolso, e deu aos meninos.

Caso 13 - Serra é privatista. Doou a Vale e vai doar o pré-sal

Em 29 de novembro de 2009, FHC dá entrevista a Augusto Nunes, para a revista (não)Veja, onde declara que relutou muito em vender a Vale do Rio Doce e que José Serra foi um grande incentivador.

Poderia continuar essa lista das “enganações” do Serra, que não abragem o choque de “jestão” (alagão, etc), o “incino” (livros errados, impróprios, etc), os contratos com farta distribuição de verbas para o “imprensalão”, mas achei que 13 era uma ótima sugestão para acabar de vez com essa fanfarronice.

PS: Não consigo nomear a origem de tudo que está citado acima (exceto as já indicadas), tantas foram as consultas feitas, mas não seria honesta se não nomeasse a grande jornalista Conceição Lemes, autora de diversos textos que li para extrair muitas das informações.


Sonia Montenegro colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz

Ilustração: AIPC - Atrocious International Piracy of Cartoons

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PressAA

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quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Que tipo de crime você já cometeu? - O professor Carlos Alberto Lungarzo explica

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A Extradição do Major Manuel Cordero

Após a extradição do genocida Cordero, alguns setores compararam seu caso com o de Battisti. Embora estes ataques estão diminuindo muito (por causa do desgaste que o mesmo ódio produz), quero rascunhar algumas idéias sobre a diferença entre crimes políticos e crimes contra a humanidade. Agradeço às redes a máxima difusão possível desta nota.

Carlos Alberto Lungarzo (*)

No dia 23/01/2009, o major (dito “coronel”) reformado do exército uruguaio Manuel Cordero Piacentini foi extraditado para a Argentina, com base no compromisso do governo desse país de fornecer-lhe a assistência médica em função da qual pedia a suspensão da extradição. Cordero está indiciado por crimes de lesa humanidade cometidos especialmente contra uruguaios exilados durante a ditadura argentina (1976-1983).

Alguns setores aproveitaram para comparar a extradição de Cordero com a de Battisti. Não é meu propósito polemizar sobre isso. Quando uma infâmia é transformada em objeto de polêmica, os polemistas conferem valor a algo que deve ser ignorado. Aliás, as mensagens de ódio contra Battisti estão diminuindo muito, porque, difundidas em forma de violenta cascata, acabam esgotando a modesta capacidade cognitiva de seus próprios autores.

Entretanto, é necessário que os conceitos tortuosos que fundamentam esses discursos sejam esclarecidos, porque muitas pessoas de boa fé podem ter dificuldades para avaliar sua verdadeira índole.

Poucos brasileiros, incluindo pessoas informadas, conhecem os detalhes do maior genocídio em países ocidentais desde maio de 1945: o do Cone Sul (1968-1982). Menos ainda são os que conhecem os bastidores da Operação Condor, na qual Brasil envolveu-se parcialmente. Já saber quem foi Manuel Cordero é mais difícil ainda. É tal o numero de genocidas, torturadores e criminosos de lesa humanidade que forneceram os exércitos e as polícias da América do Sul, que mesmo os ativistas de Direitos Humanos temos dificuldade para identificar os de maior patente. Confesso que soube quem era o major Manuel Cordero há pouco tempo.

Por outro lado, muitas pessoas honestas e lúcidas podem encontrar complicado diferenciar os conceitos envolvidos nestes problemas: por exemplo, os chamados “crimes” políticos, os crimes comuns, e os crimes de lesa humanidade apresentam zonas de superposição e ambigüidade. As instituições que deveriam esclarecer têm contribuído a aumentar a já grande confusão. Nega-se a condição de crime político (que passa a ser rotulado como crime comum) quando o réu é um inimigo, ou alguém é “gratificado” para destruí-lo, como aconteceu no caso Battisti.

As corporações militares (com raríssimas exceções em alguns países ultrademocráticos) qualificam às vezes de crime político aos crimes contra humanidade, como racismo, genocídio, tortura, matança massiva de crianças, estupro serial, etc. Observem que disse “às vezes”. Na maioria das vezes, eles não acham que esses atos sejam crimes: pelo contrário, os consideram feitos heróicos, em defesa da fé, da raça, da nacionalidade, da tradição, do sangue, da terra e outros fetiches. É bem conhecido que os nazistas queriam evitar a multiplicação de certos grupos étnicos ou culturais, matando seus membros na infância. Seus equivalentes latino-americanos não ganharam a notoriedade dos nazistas, porque as grandes potências os protegeram, mas não porque fossem menos sanguinários.

Só um exemplo. Quando o genocida Alfredo Astiz, que comandava um navio durante a Guerra das Malvinas, foi capturado pela Grã Bretanha, depois de ter-se rendido e esmolado misericórdia aos “inimigos”, o reino da Suécia o reclamou imediatamente. Ele estava indiciado nesse país pelo homicídio de uma adolescente escandinava em território argentino. O governo britânico não o entregou, como era sua obrigação moral. O manteve como prisioneiro e o liberou depois do fim da Guerra. Um país formalmente democrático se fez cúmplice da proteção de um criminoso de lesa humanidade, mesmo quando reclamado por um governo irretocável, porém, sem força suficiente para ser escutado.

A confusão entre extraditar um responsável de crime político e um autor de crime comum ou de crime contra a humanidade é incrementada pelos grupos dominantes. Quando o ditador Stroesnner recebeu asilo no Brasil, num dos muitos atos repulsivos do governo Sarney, alguns argumentaram que ele era um governante e, portanto, um político. Logo, seus crimes eram políticos!

A idéia de crime político, da qual quase todos têm certa intuição, não está até hoje formulada de maneira precisa e objetiva. Obviamente, não pretendo resolver o problema em algumas páginas, mas quero pelo menos dar algumas sugestões iniciais.

Crime em Geral e Crime Comum

A palavra “crime” tem uma carga emocional e moral muito forte. Induz a pensar em homicídio, assaltos, grandes fraudes. Entretanto, um crime é uma forma de delito (ou seja, da violação de uma lei) que, por causa de seus efeitos, é castigado pelo poder público com perda da liberdade ou da vida. Os outros delitos (como violação de uma lei de trânsito) são considerados, na maioria dos casos, infrações.

Sendo o crime também um delito, ele viola alguma lei, ou seja, uma convenção aprovada por um corpo legislativo. Desde as origens da sociedade organizada, essas convenções (leis) visam proteger as classes dominantes e favorecer a exploração dos setores pobres. Para que tivessem maior força, durante os vários milênios de poder teocrático, os crimes foram considerados pecados, ou seja, transgressões a “leis” religiosas.

Portanto, nem todo crime viola uma lei natural. Falando por alto, leis naturais são aquelas cuja observância garante aos humanos os direitos que derivam de sua condição biológica, física e social, e cuja privação os degrada. As leis naturais são conhecidas desde a Antigüidade, e aparecem com toda sua força moral na tragédia Antígone, de Sófocles, onde uma moça se nega obedecer a lei para obedecer sua consciência. O jurista Ulpiano dizia que os direitos naturais são aqueles “que foram dados a todos os animais, não apenas aos homens”.

As leis naturais são as que respeitam os Direitos Humanos básicos: à vida, à integridade física e psíquica, à liberdade, à subsistência, à dignidade, à opinião, à educação, etc. Não dependem de convenções nem de lobbies políticos, mas da natureza humana. Elas poderão mudar quando o ser humano mude. Se algum dia os humanos não precisarem mais comida para viver, então, o direito a alimentação não será já um direito básico. Por enquanto, ele é fundamental, e a violação de leis convencionais para manter este direito (como o ato de roubar comida) é totalmente legítima.

As leis que protegem o direito natural foram adotadas lentamente, na medida em que a humanidade se tornou mais igualitária, menos teocrática e militarizada. Essas leis não estavam no direito positivo antes da Revolução Francesa, e ainda são minoria na quase totalidade dos paises. O direito que reclamavam os fazendeiros alemães de prender um camponês que roubasse lenha de seu feudo para combater o frio (um dos principais problemas sociais concretos que tratou Marx na Gazeta do Reno (15/10/1842)), não é um direito natural: aliás, é um direito contra a natureza.

Vale a pena ler esta jóia da literatura sociológica, um trabalho de qualidade inusitada para a época: www.marxists.org/archive/marx/works/1842/10/25.htm

Os crimes comuns são aqueles que seus autores cometem para obter alguma vantagem para si ou para seu grupo de pertinência, são atos egoístas, que teoricamente prejudicam pessoas ou grupos “inocentes”. Assalto, roubo, e venda de drogas são típicos crimes (ou delitos) comuns: o autor procura o lucro. Mas também atos violentos sem sentido podem ser crimes comuns: por exemplo, um homem ciumento que bate em sua mulher por ter mantido relações sexuais com outro cara, também tira proveito de seu crime. Não obtém lucro, mas satisfaz necessidades doentias de posse, exclusividade, autoritarismo, fanatismo moral ou místico, etc.

Satisfazer uma patologia pode considerar-se um proveito pessoal (imediato), mesmo que suas conseqüências destruam gradativamente a personalidade do executor. Portanto, mesmo sem obter lucro, agressões familiares, brigas de trânsito, hooliganismo, estupro, vingança, são crimes comuns. Sociedades atrasadas, baseadas no patriarcalismo, a superstição e a ignorância, ainda tratam esses crimes como se fossem atos dignos. Em sociedades mais avançadas, já faz tempo que alguns deles foram questionados, mesmo sob governos tirânicos. Por exemplo, na França de Louis 13, promulgou-se uma lei condenando os duelos.

A introdução do humanitarismo no direito começou a diferenciar entre delitos que supõem uma misteriosa “vontade criminosa” do autor (como aquele que decide assaltar um banco para ficar rico) da necessidade de algumas pessoas que cometem delitos para manter sua subsistência e a das pessoas próximas. Por exemplo, um cidadão com um filho doente pode roubar antibióticos, porque em sua escala moral, a saúde e vida de seu filho estão acima do lucro do lojista. Esta não é a escala dos empresários e, na maioria dos casos, tampouco a dos julgadores e políticos.

O Brasil decidiu inventar uma categoria especial de crime comum, o crime hediondo, um conceito difuso e subjetivo que os julgadores aplicam a qualquer ato que produz asco, como seu nome indica. Pode ser um homicídio cruel, ferimentos graves, sequestros, mas, em 2003, soube-se que um tribunal acusou de crime hediondo os que contrabandeavam cosméticos falsos desde o Paraguai.

Estes absurdos podem ter sido casuais, mas, no caso Battisti, serviu para que o relator aplicasse a hediondez ao réu, aproveitando que os legisladores que redigiram a lei 9474 incluíram os esotéricos “crimes hediondos” entre os proibitivos de refúgio. A ministra Carmen Lúcia observou que esse conceito não existia nem no próprio Brasil, quando se cometerem os crimes carregados a Battisti, mas o relator não escutou.

Crimes Políticos

Crime político não é o mesmo que crime cometido por um político, nem crime com intenção política, como confusamente definem certas leis e constituições. Se assim fosse, os nazistas condenados em Nuremberg deveriam ter sido absolvidos em sua totalidade, e também os líderes dos etnocídios em Bósnia e Ruanda.

Observe, primeiro, que “crime” político é um ato político que as classes dominantes (contra as quais está dirigido) qualificam de crime. Assim, fala-se em alguns países de “crime de opinião” ou “crime de ideologia”. De fato, somente uma lei iníqua pode qualificar opiniões, crenças e valores pessoas de crime ou delito. Então, a violação dessas leis (como fez a Antígone grega) é um ato positivo para o progresso humano. Mas, um crime humanamente positivo parece um sem sentido.

Portanto, o que se pode considerar crime político é a violação de leis que, em si mesmas, não são totalmente iníquas, mas podem ser violadas quando existe um objetivo que, de acordo com certos parâmetros (como a resistência à opressão), deve ser entendido como “mais valioso que o respeito à lei”.

Por exemplo, a lei que proíbe roubar bancos não é iníqua. Entretanto, durante a Segunda Guerra, milhares de resistentes de diversos países (Noruega, Dinamarca, Holanda, Polônia, França, Grécia, etc.) atacaram bancos para enfraquecer o poder financeiro do invasor nazista.

A intuição sobre “crime político” é bastante forte na maioria dos casos, mas carecemos de uma especificação formal adequada. Minha opinião é que, para ser “crime político” e, portanto, invulnerável à extradição e merecedor de asilo, um delito deve cumprir, pelo menos, estas condições:

1. Deve consistir numa ação exercida por cidadãos ou grupos contra um governo, sistema ou estrutura de estado que é considerada pelos atores como opressiva, ilegítima, desumana, etc.

Pode estar dirigida também contra estruturas privadas de repressão que possuem um poder paralelo ao estado, como empresas de segurança, jagunços, gangues de fazendeiros e empresários, esquadrões da morte, etc.

2. Deve possuir um esquema ético-ideológico que permita definir seus objetivos em função dessa luta contra a opressão.

3. Não pode desenvolver uma violência maior que a estritamente necessária para proteger seus militantes e para avançar na ocupação de objetivos, mas não deve atingir inimigos que estejam neutralizados. Por exemplo, em alguns países, grupos considerados de esquerda executaram pessoas que já estavam rendidas, como no caso do partido Naxalite, na Índia, do ETA, na Espanha, e do IRA, na Irlanda. Esses crimes não são políticos; de acordo com sua índole, podem ser comuns ou contra a humanidade, embora estejam envolvidos numa atmosfera política. A comissão destes crimes, porém, não autoriza a qualificar a ação total do grupo como terrorista. Já a execução de alguns torturadores pelo MIR em 1974 no Chile, foi um crime político em estrita defesa. Nenhum grupo resistente tinha infra-estrutura para impedir a continuação da tortura, sem executar os torturadores.

(Há uma polêmica entre as organizações de DH sobre este tipo de crimes, mas existe consenso em que morte de genocidas e torturadores, quando não podem ser detidos por outros meios, é crime político. Anistia Internacional considera que estes crimes não transformam seus autores em “prisioneiros de consciência”, porque o uso da violência vai além da consciência e da ideologia, mas reconheceu em numerosos casos como “prisioneiros políticos” a pessoas que usaram violência defensiva.)

4. No desenvolvimento de uma luta contra a opressão, os oprimidos não podem transgredir leis do direito natural. Ficam proibidas: (a) Mortes desnecessárias, que não sejam em legítima defesa, direita ou não. Por exemplo, as execuções atribuídas a “justiça revolucionária” são mortes desnecessárias e constituem crimes comuns. (b) Aplicação de tortura, em qualquer caso. (c) Humilhação ou desrespeito com os prisioneiros. (d) Negativa de atender as necessidades dos prisioneiros, na mesma medida em que são atendidas às necessidades dos resistentes: alimentação, saúde, proteção do clima, lugar onde dormir, ocupação e lazer, quando seja possível.

5. Os grupos resistentes devem se autodissolver (ou reestruturar) logo que sejam obtidos seus objetivos. Não devem eternizar-se como forças militares, e devem entender seu uso da violência como necessidade transitória.

Alguns grupos de resistentes (como o setor original dos Montoneros, na Argentina) adotaram as hierarquias e os fetiches da alienação militarista, e alguns de seus atos não podem ser considerados crimes políticos. Em particular, a vocação pela morte típica das corporações armadas deveria privar aos grupos resistentes dos benefícios dados aos autores de crimes políticos. A degradação de grupos dissidentes ao nível dos próprios perseguidores os desqualifica imediatamente.
Crime de Estado e Crime de Lesa Humanidade

Então, brevemente: um crime político deve ter como meta a resistência contra certa forma de poder que, desde sua perspectiva ideológica, os atores consideram opressivo. Além disso, deve ser exclusivamente defensivo ou organizativo, precisa manter-se contrário a qualquer forma de tratamento cruel, e não deve adotar qualquer forma de militarismo.

É uma falsidade grosseiramente espalhada pela direita (muito comum no Brasil, quando Tarso Genro concedeu refúgio a Battisti) que a esquerda considera crimes políticos só os que são cometidos por seus membros.

Os opositores de um sistema opressivo são quase sempre de esquerda, mas também há resistentes de direita. Com efeito, um regime pode ser considerado opressivo por setores de esquerda e de direita, ao mesmo tempo, mesmo que isso aconteça por motivos diferentes.

Neste sentido, Cuba é um cenário de múltiplas variedades de crime político.

Os opositores que tentam derrubar o governo da Ilha para estabelecer uma democracia tradicional aliada aos Estados Unidos são de direita. Os desertores do exército cubano cometem delitos políticos e merecem a mesma proteção que os que fogem de regimes de direita. Do ponto de vista humanitário, a opressão exercida pela esquerda é um desvio, e não pode ser considerada como um tratamento justo contra a direita.

Mas, o regime cubano também tem opositores de esquerda. São os que exigem a instalação de um governo verdadeiramente socialista com uma democracia popular, como estava nos projetos de Che Guevara e Camilo Cienfuegos, eliminando as hierarquias partidárias e burocráticas e promovendo uma igualdade absoluta.

Já os terroristas, como Posada Carriles, Fernando de Montejo, o grupo Alfa 66, e pessoas ou organizações que produziram várias catástrofes humanitárias (explosão de hotéis e aviões, assassinatos em massa) são terroristas, e seus crimes são crimes contra a humanidade.

Pode parecer esquisito, mas outro caso que ilustra a diferença é o nazismo. O golpe tentado por Hitler em Munique em novembro de 1923, foi um delito político. Seu objetivo era derrubar o governo da República de Weimar e impor um sistema fascista como o da Itália. A meta não era louvável, mas o que caracteriza o crime político não é sua “virtude”, mas a percepção que seu autor possui do regime contra o qual se pronuncia. A motivação ideológica do futuro Führer foi atacar um sistema que, de acordo com seus padrões ideológicos, os nazistas achavam opressivo.

Entretanto, todos os outros crimes cometidos pelo nazismo desde a Noite dos Cristais são crimes de lesa humanidade, misturados com crimes comuns.

Por sinal, o ministro Tarso Genro afirmou que daria refúgio a um fugitivo fascista cuja extradição era pedida por Itália, desde que não tivesse cometido crimes contra a humanidade. Ele rejeitou o refúgio e o governo italiano parece não continuar insistindo, o que faz supor que aquele pedido de extorsão foi uma máscara para dissimular a animosidade contra Battisti. Mas, o que importa é que o ministro ofereceu refúgio a um fascista.

Outro exemplo é o de Anistia Internacional. Durante os Anos de Chumbo, o governo italiano prendeu e submeteu a tortura a centenas de militantes de esquerda. Para manter aparência de objetividade, também prendeu alguns fascistas que depois foram liberados. Nossa organização pediu a liberdade de um desses fascistas que foi mantido preso durante anos, por desentendimentos entre os setores que apoiavam o governo.

Mas, que são, então, os crimes contra a humanidade?

São crimes que atendem, pelo menos, as seguintes condições:

1. São cometidos pelo poder estabelecido. Por isso, constituem um caso particular de crimes de Estado. Ou então, seus autores são grupos paralelos de poder: ligas de empresários, traficantes de armas, latifundiários e ruralistas, bandas organizadas de para-policiais e para-militares. No exemplo de Cuba, o grupo Alfa 66, e outros grupos terroristas de grande impacto, são sustentados (embora não façam parte dele) pelo governo dos Estados Unidos.

2. Quando exercidos por um estado, seu objetivo é a dominação política, e a aniquilação dos opositores (o termo “aniquilação” foi oficialmente usado pelo governo da viúva de Perón, na Argentina, em 1974, e aceito pelos demais partidos). Quando exercidos por um grupo terrorista paralelo, procuram aniquilar a estrutura de um estado considerado inimigo.

Por exemplo, o massacre em Pando, Bolívia, em setembro de 2008, foi promovido pelos governadores departamentais (estaduais), apoiados pelas corporações e os colonos ricos. Trata-se então, de um crime de estado, onde o autor não é o governo central, mas as autoridades locais.
3. Consideram as vidas humanas descartáveis, sem que importe a pessoa específica e seu grau de envolvimento nos fatos. Podem gerar democídios (crimes massivos de pessoas indesejadas, sejam ou não inimigos), etnocídios (homicídios massivos de etnias), chacinas terroristas, e, em geral, massacres onde as vítimas podem ser quaisquer, desde que exteriores ao grupo que as pratica, etc.

Nesse caso, o objetivo é apenas demonstrar poder e infundir terror, como faz a maioria dos exércitos com a população civil de países em guerra. Na prática, quase todo corpo militar comete crimes de lesa humanidade. O fato de que os nazistas sejam considerados criminosos especiais contra a humanidade, se deve ao planejamento minucioso de seus crimes, o alto impacto quantitativo e o fato de que fossem aplicados sobre a população branca da Europa. Crimes similares e piores foram cometidos contra índios e negros até hoje, sem que houvesse nenhum tipo de punição. Esse é o principal motivo que torna os militares de cerca de 120 países em inimigos radicais dos DH, pois estes direitos proíbem a matança de civis e o terror bélico.

4. Aplicação de formas cruéis e desumanas de tratamento, com o objetivo de mostrar poder, satisfazer necessidades psicopáticas dos executores (que são, em sua maioria, personagens altamente doentios) e infundir terror. Tortura é o mais aberrante crime contra humanidade, porque visa apenas produzir sofrimento.

É importante ter em conta que nenhum crime comum pode ter o efeito destrutivo de um crime contra a humanidade. Por exemplo, uma enorme gangue que assalte bancos dificilmente poderá matar, ao longo de toda sua vida criminosa, mais de 100 pessoas. Um pequeno exército pode fazer vários milhares de vítimas em poucas horas.

A comissão de crimes contra a humanidade está influenciada pelo sistema político ao qual aderem os autores. Mas, essa influência não é estrita. Países com democracias antigas e estáveis, como os Estados Unidos, cometeram crimes de lesa humanidade em altíssimo grau na Coréia (1950-1953), no Vietnam (1964-1975) e em outros lugares, fantasiados do que os militares chamam “dano colateral”. Aliás, o próprio partido nazista ganhou o poder por eleições, embora logo em seguida se transformasse em ditatorial.

Agora já sabemos a diferença entre as duas extradições. Cordero é um autor de crimes contra a humanidade. Envidou esforços para eliminar exilados uruguaios morando na Argentina, o que incluía algumas dúzias de seqüestros com desaparições definitivas, alguns homicídios explícitos, centenas de sessões de torturas e vários estupros.

Battisti é autor de delitos políticos, chamados “crimes” pelo aparelho repressivo brasileiro-italiano. Talvez suas ações e as de seu grupo não fossem as mais adequadas para o objetivo libertador que se propunha a esquerda italiana da época. Entretanto, os esquerdistas, esmagados entre o fascismo ressuscitado, por um lado, e pelo neo-stalinismo, pelo outro, encontraram nesses grupos violentos o único nicho de atuação.


Carlos Alberto Lungarzo foi professor titular da UNICAMP até aposentadoria e milita em Anistia Internacional (AI) desde há muitos anos. Fez parte de AI do México, da Argentina e do Brasil, até que esta seção foi desativada. Atualmente é membro da seção dos Estados Unidos (AIUSA). Sua nova matrícula na Organização é o número 2152711.

Colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz

Ilustração: AIPC - Atrocious International Piracy of Cartoons

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domingo, 24 de janeiro de 2010

AS VAIAS A CUSTÓDIO E À PATOTA TUCANA


Laerte Braga

A avaliação de um motorista de táxi é perfeita. O prefeito Custódio Matos apareceu para a cidade no dia da posse, na entrega da chave ao rei momo, no aumento abusivo e extorsivo do IPTU e, agora, quando da visita do presidente Luís Inácio Lula da Silva.

No mais é um eterno ausente. Não tem a menor noção do que acontece em Juiz de Fora, exceto...
Tem sempre o exceto. Nas muitas mutretas do seu governo.

Não há diferenças que não de estilo entre Custódio Matos e Alberto Bejani. São idênticos nas práticas políticas. Corruptos e meros projetos pessoais, Custódio um pouco amplo, já que o PSDB é um braço de um dos mais traiçoeiros esquemas que alcança todo o Brasil e implica a hipótese dos tucanos voltarem ao governo, numa grande transformação.

Deixamos de ser Brasil passamos a ser BRAZIL.

É o sonho dourado dessa gente. Se pudesse e se existisse tecnologia para isso, o prefeito de Juiz de Fora ressuscitaria o “fog” londrino e o traria para a cidade. Em serviço terceirizado evidente. Do contrário como faturar para a campanha do filho na tentativa de virar deputado?

Tem paixão por Londres.

Aquele Custódio dócil, gentil, cheio de promessas e projetos da campanha de 2008 não existe mais. Tucano nenhum é doce, gentil, mas todos são cheios de promessas quando se trata de alcançar o objetivo.

Quando Roberto Campos disse a Paulo Maluf que valia a pena investir cem milhões de dólares na tentativa de ganhar as eleições presidenciais, pois em quatro anos o investimento decuplicaria, chegaria a um bilhão de dólares, estava apenas definindo o modo de ser tucano em campanhas eleitorais.

No barato, por baixo, levando em conta que parte é de Bejani, parte é de setores da FEAM – FUNDAÇÃO ESTADUAL DO MEIO AMBIENTE – com destaque para o procurador Joa/quinzinho, o prefeito leva um milhão por mês no contrato com a empresa Vital Engenharia Ambiental Ltda, braço da Queiroz Galvão.

O “negócio” do lixo, que vai terminar por aqui na privatização do DEMLURB e um grande número de servidores demitidos, é preocupação nacional e objeto de inquérito em curso na Polícia Federal. No dia que explodir, vier à tona, não há aterro sanitário capaz de agüentar tanta podridão.

Buscar o que lhe é “devido”, imaginar a campanha do filho para a Assembléia Legislativa, dispor de recursos para farta propaganda, isso o prefeito faz. No mais, a primeira-dama, o secretário Vítor Valverde e a secretária Suely Reis (oriunda do bejanismo) tratam a cidade como propriedade privada em função de seus interesses. São os que governam, se é que se pode dizer assim.

Quando o secretário de Saúde Marcus Pestana (transformou a Secretaria em birô para sua eleição à Câmara dos Deputados) diz que as vaias foram orientadas e que seu partido venceu as eleições no bairro de Santa Luzia, está justamente esquecendo isso. Venceu e não cumpriu uma só das promessas feitas pelo governador Aécio Pirlimpimpim Neves no comício de encerramento da campanha de 2008. Foi em Santa Luzia como disse o próprio Pestana.

A saúde está sendo toda ela terceirizada. Não existe a menor preocupação com os profissionais da área, com o cidadão que se vale da saúde pública, apenas com o lucro, o que rende, o que permite a demagogia de boa parte da mídia atolada de “anúncios” das obras invisíveis de Custódio.

O caráter e a personalidade de Custódio, isso é comum a tucanos, guarda uma semelhança com o personagem interpretado por Anthony Perkins em “Psicose”, um clássico de Hiticock. Aquele sujeito bonzinho, que ama a mãe acima de tudo, respeita os valores da família, toma conta da pousada, no caso da cidade, com zelo e tudo organizado mas...

...Os porões estão repletos de cadáveres de incautos que acreditam na aparência e promessas dessa gente.

As vaias ao prefeito (prefeito?) Custódio Matos não foram orquestradas, organizadas, o que quer que seja no entendimento do secretário Marcus Pestana – se for aberta uma auditoria séria na Secretaria Estadual de Saúde sai algemado –. Foram a reação espontânea de cidadãos que se sentem ludibriados por um político despido de respeito por quem quer ou o que quer que seja, que não o lucro no sacrossanto “negócio” da corrupção.

É o Bejani II.

E essa falta de respeito, vamos ficar com esse termos, se estende à cidade de Juiz de Fora como um todo.

E deita ramas na Câmara Municipal, setores do Poder Judiciário, no governo do Estado com largo respaldo da empresa privada. A que contribui (Custódio é especialista, faz parte do mensalão de Eduardo Azeredo) naquele esquema de dar dez e depois levar cem.

O perigo é o secretário Vítor Valverde, capataz da guarda-municipal mandar as “tropas” avançarem sobre o povo. O cara tem uma coroa de louros imaginária sobre a cabeça, qualquer dia se proclama César.

Aí vai ser o diabo. Nem o vereador Tico Tico aumentando o tom do seu me ajuuuuuudem a ajuuuudaaaaar vai resolver. O eco pode é derrubar o prédio onde funciona a Câmara Municipal.

Laerte Braga, jornalista, colabora com esta nossa Agência Assaz Atroz

Ilustração: AIPC - Atrocious International Piracy of Cartoons

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sexta-feira, 22 de janeiro de 2010

Ives Granda, um infeliz discriminado e acuado

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Adivinhe quem foi o desaventurado que disse isso:

“Como modesto advogado, cidadão comum e branco, sinto-me discriminado e cada vez com menos espaço, nesta terra de castas e privilégios.”

O sujeito é esse:


(Clique na imagem para ampliar)

Ives Granda é candidato a ministro de uma possível ditadura que se instale no Brasil, depois de golpe de estado contra o governo Lula.

Aditor-Assaz-Atroz-Chefe

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"FOLHA" FAZ NOVA PROVOCAÇÃO

Celso Lungaretti (*)

Ives Gandra Martins é um advogado tributarista que ensina a grandes clientes como pagarem menos, ou nenhum, imposto de renda.

Ou seja, presta relevantes serviços à causa da desigualdade social, já que alivia os ricos das mordidas do leão, enquanto os pobres, não contando com assessoria jurídica da mesma qualidade, acabam se sujeitando a tributos injustos e até ilegais.

Houve tempo em que ele era atração exclusiva do jornal O Estado de S. Paulo, eternamente alinhado com os interesses empresariais.

Agora, a Folha de S. Paulo também lhe concede espaço de articulista. E não na sua área específica, mas para falar sobre o que desconhece e não tem isenção para abordar: ditadura militar x resistência.

Seu artigo de hoje, Guerrilha e redemocratização, não passa de uma síntese da propaganda enganosa que os sites fascistas trombeteiam sobre o período de 1964/85 e, mais especificamente, sobre a terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos.

Parece que, ao lecionar Direito na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e na Escola Superior de Guerra, foi ele quem recebeu lições dos alunos... as piores possíveis.

Diz que, ao resistir ao terrorismo de estado implantado pelos golpistas de 1964, "a guerrilha apenas atrasou o processo de retorno à democracia".

Justifica as atrocidades ditatoriais com a falácia de que os verdadeiros responsáveis foram os que não se submeteram a viver debaixo das botas, pois "ódio gera ódio, e a luta armada acaba por provocar excessos de ambos os lados". É a velha piada do brutamontes se queixando de haver machucado a mão ao esmurrar a cara de um fracote...

Minimiza a contribuição dos movimentos de resistência à democratização, que, segundo ele, se deveu principalmente à atuação da OAB e de alguns parlamentares.

Aponta Hugo Chávez como eminência parda do PNDH-3 ("o programa é uma reprodução dos modelos constitucionais venezuelano, equatoriano e boliviano"), o qual estaria sendo "organizado por inspiração dos guerrilheiros pretéritos" (leia-se Paulo Vannuchi).

E insinua que a presidenciável do PT tem esqueletos no armário, pois, se forem apurados também os excessos porventura cometidos pelos resistentes, "isso não será bom para a candidata Dilma Rousseff". Se tivesse algo consistente para dizer, faria acusações concretas, ao invés de lançar indiretas para causar suspeitas, sem que fique exposto a uma ação por calúnia e difamação.

Se essa visão distorcida e tendenciosa da extrema-direita, expressa pelo Gandra Martins, tivesse a mínima relevância à luz dos valores civilizados, seria fácil refutar seu artigo de amador que invade destrambelhadamente a seara dos profissionais.

Mas, nem ele é importante como analista político, nem os artigos de Opinião da Folha são referencial para coisíssima nenhuma atualmente.

O jornal da ditabranda está sempre laçando fascistas acidentais que escrevam textos provocativos, capazes de motivar uma enxurrada de refutações. Quer dar a impressão de que ainda é um veículo polêmico, trepidante.

Não farei o seu jogo, pois tanto a Folha de S. Paulo quanto o ideário que norteou o artigo de Gandra Martins só merecem de mim o mais absoluto desprezo.

* Jornalista e escritor, mantém os blogues
http://naufrago-da-utopia.blogspot.com/
http://celsolungaretti-orebate.blogspot.com/


Texto enviado a esta nossa Agência Assaz Atroz pelo autor, com autorização de "livre publicação".

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